quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Escrituração contábil completa


Alexandre Gonzales
Contador, especialista em direito Tributário, mestre em Contabilidade, doutor em Controladoria e Contabilidade. Professor do departamento de Ciências Contábeis da PUC/SP 

A contabilidade tem por objetivo fornecer informações úteis para tomada de decisão, e atende diversos usuários. Os usuários da Contabilidade podem ser internos ou externos à empresa. Como usuários internos podemos citar a título de ilustração gerentes, administradores, sócios, e como usuários externos podemos citar investidores, credores, fornecedores, clientes, sindicatos e governo.
O governo em nosso país sabe utilizar muito bem a contabilidade para tomar suas decisões. Seria possível arriscar até mesmo uma afirmação no sentido de que possivelmente seria o usuário da informação contábil que mais exerce seu papel. Para sustentar tal afirmação seria suficiente observar o volume de informações que são prestadas ao Fisco que se originam na contabilidade das empresas.
O governo, na qualidade de um dos usuários da contabilidade, eventualmente pode não querer algum tipo de informação. É o que acontece com a escrituração contábil das empresas em boa parte dos casos nos quais há a opção pela tributação com base no lucro presumido. Como regra geral (não se aplicando a todos os casos) a Receita Federal não exige escrituração contábil completa das empresas, satisfazendo-se com a escrituração do livro caixa. Essa previsão está no artigo 527 do atual Regulamento do Imposto de Renda, decreto 3.000/99.
Como em toda regra, há exceções. Uma delas seria na hipótese de amparar distribuição de lucros isentos de imposto de renda aos sócios, em montante superior ao lucro presumido estipulado na legislação.
Mas vejamos, no início desse texto vimos que há diversos usuários da contabilidade. Um deles exerce de maneira tão exemplar seu papel que as pessoas chegam a utilizar suas normas para indevidamente generalizar situações. É o caso de uma empresa não possuir escrituração contábil completa por ser lucro presumido. Vamos colocar as coisas em seus devidos lugares. Lucro presumido é uma forma de tributação federal, e as normas decorrentes dessa forma de tributação existem para atender o usuário Receita Federal.
Será que poderíamos utilizar esse argumento para deixar de prestar informações aos demais usuários da contabilidade? Se uma empresa for fornecer a órgãos públicos conseguirá deixar de apresentar demonstrações contábeis ao realizar seu cadastro junto ao SICAF com base nesse argumento, por exemplo? Pouco provável.
No sentido de esclarecer um pouco essa questão atualmente há um projeto de lei, número 4774/2009, que pretende tornar obrigatória a elaboração de demonstrações contábeis por parte de empresas optantes pelo lucro presumido, por meio da alteração da Lei nº 8.981/95.
Caso esse projeto altere a legislação vigente, é provável que essa questão sobre elaborar ou não demonstrações contábeis quando a empresa é optante pelo lucro presumido fique menos nebulosa. E para tentar afastar de vez essa nebulosidade, podemos recorrer ao Pronunciamento Conceitual Básico (R1), elaborado pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis, documento que prevê a elaboração e apresentação de demonstrações contábeis para usuários externos em geral, “tendo em vista suas finalidades distintas e necessidades diversas”, admitindo inclusive que autoridades tributárias possam determinar especificamente exigências para atender seus próprios interesses, sem afetar as demonstrações contábeis elaboradas de acordo com a estrutura conceitual.  
A própria estrutura conceitual da contabilidade já prevê a utilização de demonstrações contábeis por diversos usuários. E faz todo sentido, uma vez que o objetivo da contabilidade é fornecer informação útil para tomada de decisão, e são vários os agentes que estabelecem contratos com as empresas precisam de informações dessas informações.



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